16.8.06

Máximas e Aforismos

A neurose escreve coisas lindas no rosto.

Quantas vezes não me perdi pelo caminho. Habituei-me a ir sobrevivendo no necessário.

Todas as tardes, a velha senhora manca, de porte altivo, senta-se na mesa do que café que frequento. Ausenta-se numa folha de papel que rabisca incessantemente, porque os dias escasseiam, ela sabe. Por vezes, há um certo encanto na sua expressão subitamente rejuvenescida. Mágicas as palavras evocatórias, em busca do tempo perdido, o único ainda possível.




Edward Hopper, Morning Sun
Comments:
olá!
às vezes passo por aqui, hj decidi deixar rasto. mudei de coordenadas há pouco tempo, deixando um blog de finais de 2004 em suspenso, para reencarnar neste link que aqui fica, numa pausa de um dos nossos trabalhos finais.
bom cantinho, o teu ;)
 
esqueci-me da assinatura!

inês (porto)
 
Caro Paulo,
Essa senhora busca o mesmo tempo que eu, quando me sento em qualquer sítio e rabisco com a igual intensidade textos que depois morrem sem um fim, ou que ficam eternos porque não terminam, não sei bem... Só para dizer que, oh bom leitor de angústias, não as encontrarás somente nas senhoras mancas do café que frequentas, mas um pouco por todo o lado. Incluindo nos quadros do Hopper.
 
Sim, mas nota uma coisa. O que que me atemoriza na velhice é ver aquelas pessoas que chegam a um estado em que, por assim dizer, "o único tempo ainda possível" é o passado. Penso que um indivíduo pode chegar a esse estado por uma terrível mistura de ignorância (falta de interesses pessoais que ultrapassem a passividade da televisão ou do dominó) e miséria, como acontece com grande parte dos velhos portugueses. Pode-se também chegar aí pelo infortúnio pessoal: morte dos entes queridos, doenças...
Somos demasiado jovens para conhecer na pele essa solidão, espécie de antecâmera da morte. Eu espero nunca vir a conhecê-la. Mas quem sabe o futuro?
 
Pego nas tuas últimas palavras, mais do que a ignorância ou falta de interesses pessoais, creio que o maior problema será mesmo a solidão. Não deve ser fácil fazer amigos nessa idade, quando os de sempre já morreram, quando os filhos não existem ou não se importam. O dominó é uma desculpa para ter companhia, como as idas constantes ao centro de saúde para conversar. O álcool e a tv são outros "bons" amigos, sempre presentes e que distraem. O que mais assusta, num país a envelhecer, é a total ausência de medidas para aproveitar tanta gente estacionada nos parques, nas tascas e à beira dos caminhos (imagem habitual nas aldeias e vilas pequenas do interior). Vivemos num país que envelhece mas que continua a valorizar apenas o que é jovem, não queremos ser lembrados dessa inevitabilidade. Individualmente, creio que o medo é comum a todos nós, todos tememos terminar sós, e com a angústia de nada termos feito com a vida. Esperemos que não seja assim...
 
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