26.2.07
Glórias Passadas

Quem embarca num dos muitos cruzeiros que descem o Nilo depara-se com terras miseráveis e populações que vivem, em grande parte, da herança grandiosa do Antigo Egipto. Os barcos fazem escala em povoações próximasdas ruínas dos templos mais magníficos e os naturais dessas terras recônditas vêem o turista ocidental comosinónimo de dinheiro. Não admira: o salário médio do país é de 100 euros e há uma faixa muito grande de egípcios a viver no limiar da subsistência.
Em Kom Ombo, por exemplo, logo que metem o pé em terra e começam a caminhar numa espécie de avenida esburacada e lamacenta, aparentemente em obras, em direcção ao templo dedicado aos deuses Haroeris e Sobek, os turistas são abordados por dezenas de miúdos esfarrapados e sujos, que mendigam gorjetas ou tentam vender toscos escaravelhos – símbolos da sorte – feitos de barro.
Mais à frente, mulheres sentadas no chão, todas cobertas por vestes negras, mostram véus eexóticos trajes de dança do ventre, cravejados delatão dourado. No regresso ao barco, depois de apreciado opôr-do-sol, com o grande Nilo no horizonte e as tonalidades douradas do fim de tarde reflectidas no templo, o assédio é ainda maior. Os lojistas dopequeno mercado instalado no exterior do monumento não têm mãos a medir. São vendedores extremamente persistentes e, por vezes, as suas técnicas de vendaroçam a aldrabice, como quando apregoam um preço que afinal “era só para ver a peça”, ou quando tentam transformar o troco devido numa pequena pirâmide oununs horríveis brincos “kitsch”.
Ultrapassado o mercado, surgem pequenas figuras fantasmagóricas, mais escuras do que o escuro envolvente, que parecem fascinadas com a presença destes pálidos extraterrestres falantes de línguas estranhas, bem vestidos, munidos de máquinas fotográficas digitais,câmaras de filmar, telemóveis e outros utensílios muito vistos, mas nunca manuseados. Extraterrestres que representam a hipótese de aquelas criança sencardidas poderem ter uma refeição melhor. Mesmo dando o desconto de uma certa encenação para impressionar, a miséria é grande. E, não fosse a glória dos faraós – que explica os milhares de turistas que caminham por aquelas avenidas esburacadas–, seria ainda maior.
[PB, publicado em 2003]

22.2.07
The Road to Guantanamo

The Road to Guantanamo, docu-drama realizado em 2006 por Michael Winterbottom. Um trabalho importante para quem se interesse pela temática dos Direitos Humanos.