30.1.07

Sobre Portugal

(...)"Nunca encontrava hotéis assim em África. Os que encontrava eram feitos com pavimentos de azulejos vidrados, janelas de alumínio ionizado, tinta de parede aos picos, lâmpadas assépticas de néon, alcatifas industriais, camas lacadas, colchões ainda envoltos no plástico da compra, colchas de cetim com lantejoulas: os piores materiais de construção e os mais feios objectos de decoração que a modernidade soube produzir vão parar à África negra. Mas é o lugar procurado por quem nunca o teve, nem sabe do que realmente é feito. Um denominador comum a todos os luxos, e talvez o único verdadeiro luxo, é o de poder ver longe. Abrir as janelas de par em par e sentir que é o mundo que entra em casa. Não admira que toda a especulação imobiliária se baseie neste engodo: «vistas». Quando as não há, recorre-se ao «plano B»: condomínio privado. Vigilância contínua, circuito fechado, qualidade de vida enfrascada numa realidade protegida e estanque. Penso na alegria linfática que corre nas vielas italianas, na «fiesta» em horário contínuo das praças espanholas e mexicanas; na hora de ponta holandesa, feita de bicicletas em voo livre, nas cidades marítimas neo-zelandezas abertas ao vento austral. Volto a pensar no condomínio fechado português. Tal como no hotel do Congo, é também ele, o luxo procurado por quem nunca o teve, nem sabe do que realmente é feito. (...)"
Gonçalo Cadilhe, revista Única (Expresso), 20/01/07



"É a minha opinião e apenas isso: a ideia de 'eleger' por voto telefónico de valor acrescentado os 'maiores portugueses de sempre' é simplesmente idiota e só pode chegar a conclusões constrangedoras.(...) Já a escolha de Salazar e Cunhal entre os '10 mais', devo reconhecer que faz todo o sentido e corresponde ao sentimento profundo que uma larga parte dos portugueses tem sobre a liberdade: um bem acessório. Salazar governou em ditadura durante quarenta e tal anos; Cunhal só não o fez porque foi impedido pela parte sã da nação. Salazar fez de nós o país mais retrógrado e subdesenvolvido da Europa; Cunhal tentou o que pôde para nos transformar numa Albânia. Ainda hoje pagamos a factura, económica e intelectual, das suas heranças. Que uma grande parte dos portugueses ache que eles são dos maiores de sempre entre nós explica a razão pela qual somos actualmente o mais atrasado país da Europa.(...)"
Miguel Sousa Tavares, Expresso, 20/01/07
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