13.12.05

Uivos


(Jan Bengtsson)


Canto primeiro

"Born in this world
You got to suffer
Everything changes
You got no soul
Try to be good
Ignorant and happy
If you hit the blues
Eat jelly sweets
Die when you die
Die when you die
Lay down you lay
Die when you die"


Canção do corpo mortal
no corpo onde há-de morrer tudo o que tenho
na inspiração vertiginosa do poema a mudar de vida
nos sítios que deixei arrefecer, que faço ainda aí?
nas barreiras onde não as havia dantes
na possibilidade de expansão no Mundo
no seu ar radiante sem precisarmos de dizer nada
"nos melhores da minha geração, destruídos pela loucura, esfomeados, histéricos, nus"
no cabelo olhos castanhos 70 quilos metro 75
no algo que nos eleve do marasmo, da melancolia
nos caroços de peito no cancro para a cura
na dor aguda gemendo suores e ladainhas
nos sutras do buda cosmológico Amitabha, atenção ao Som
na fístula aberta sangrando constantemente
no fascismo de casino (terceira via)
no gozo, esse estilo heróico
no tudo é forma é eterno vazio
nos fraseados de allegro a sotto voce
na aura verdadeiramente misteriosa do único
nos miradouros miratejos
no abismo uns dos outros
"in music strong I come, with my cornets and my horns"
na necessidade de me iludir, de novo
na usura da cidade desencantada, cantando
nas emissões de rádio livre
nos motivos não verbalizados está a ser difícil ser
na matriz o pater
nos emparedados
nas gatas mortas mijando rosas de encontro ao paredão
no comprar tudo feito
nas seis verdades ou perfeições budistas
nos aposentados do 46 entre Santa Clara e Cruz de Celas
no Monte de Vénus febril e húmido
nos putos com bola há ali uma escola com sala de convívio e conselho directivo
no cansaço de tanta humanidade, tanta humanidade na televisão
no hoje após ontem que foi igual a amanhã
no riso tonto das velhas do yoga
na miséria com que nos agredimos
nas instalações neuróticas de dançar sozinho
no Deus que está na nossa cabeça
nos arremedos de romantismo embatendo violentamente num ser arredado da paixão e do seu pathos
no Inferno somos nós
“dans la musique savante qui manque a notre désir”
nas pazadas do coveiro sobre um pedaço de mim
nos miasmas loquazes de última análise
na viagem que não pode ser adiada
na esplanada de vistas para o rio com mulheres dentro
na compaixão eterna de Samantabhadra
nos buracos confortavelmente burgueses vivendo por procuração
na líbido não está comigo
no pensar o indizível seria nomeá-lo
na sabedoria de manter os preceitos: não ser insincero!
na universalidade da beleza a universidade a unidiversidade
no in girum imus nocte et consumimur igni
na verdade de estado adere ao mercado tudo o que é falso será denunciado
“nas suaves vibrações do desejo dadas com carne mão falo para coxa e vagina”
nas musas raras em curto circuito
nos vagabundos do dharma
no "estar sempre do outro lado da festa"
nas espécies umbrícolas
nos equívocos do silêncio nos equívocos das palavras
na linguagem dos Sátiros
nas mulheres pedradas igrejas imaculadas etc,etc, etc
na utopia que já não consigo dizer
nas corporações do cimo da colina a viver da exploração
na empresa onde escravamos a trabalhar
no "whoever degrades another degrades me"
no pensamento parado dos Lunáticos ZaZen
nos jardins eflúvios do Palácio, por paisagens de fertilidade e abundância
na verdade contra o Mundo ou vice versa
"na orgia de todos os olhos radiantes beijando o seu corpo mortal"
no pátio interior onde te ocultas de novo
nos teus olhos
com os teus olhos
com os teus olhos
a sós


Canto Terceiro
"Hei, Father Dead, I‘m flying home
Hei, Poor Man, y‘re all alone
Hei, Old Dady
I know where I‘m going
Old Aunty Dead
Don‘t hide your bones
Old Auncle Dead
I hear your groans
Oh, Sister Dead
How sweet your moans
Oh, Old Dead
Your word‘s are true
Thank for inspiring me
To sing this blues
Genius Dead
Your art is done
Lover Dead
Your body‘s gone
Father Dead
I‘m coming home"

[Escrito em 2000. Os cantos primeiro e terceiro são da Ma Rainey.]
Comments:
Barbas, isto é brilhante. Os links são uma ideia genial e tornam o poema muito dinâmico. Poderia batizar-se isto de "hiperpoesia", ou seja, poesia com hipertexto (os links). Ir lendo e ir abrindo sites é uma viagem. Genial!
 
Ainda bem que gostaste. Lembrei-me de pôr os links porque o texto faz referências constantes a outros textos, assim como a músicas e lugares. Como diria o nosso inspirador Júlio Taborda, está cheio de paráfrases.
 
Enviar um comentário

<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?